TEMPOS DE FEIRANTE
O trabalho era dureza, mas gostei daquele tempo. Na nossa banca vendíamos roupas; ela ocupava o espaço linear de oito ou dez metros, dependia do local e do movimento. Mediana, comparando com a banca do Mizael, que era a maior, e algumas outras que mediam a metade da nossa.
Às quatro da manhã normalmente já estávamos, eu e outros, meus irmãos às vezes, na casa do patrão, dentro da carroceria do caminhão aguardando ele se ajeitar para sair. Gastava um tempão enroscado no banheiro, o que era causa de deboche para nós, a molecada. O terror, é que em alguns dias da semana a feira acontecia em bairros de periferia, em ruas sem asfalto e normalmente com água de esgoto a céu aberto passando no local concorrendo com o espaço da barraca. Piorava nas madrugadas chuvosas e frias; para não falar do quase insuportável, que era quando acontecia de estendermos as grandes e pesadíssimas lonas sobre as cacas dos cães e gatos que existiam em abundância nesses locais. Nas madrugadas pouco se enxergava. Montar e desmontar as barracas era sofrido, mas na hora do movimento eu gostava. As gentes passando, a gritaria dos vendedores, muito folclóricos às vezes. As piadas, os deboches; os sutiãs 54, as calcinhas de 2ª. com ventilação (pequenos defeitos na malha), mexiam com a imaginação dos meninos. A barraca da Portuguesa, ela, a Portuguesa, tão boca suja quanto a Derci Gonçalves, quando enquadrava o marido fazia a diversão de todos nas proximidades. Era a o ápice da luta livre, comentários apaixonados e inocentes não faltavam. “Juiz sujo, permitiu que o Aquiles fizesse aquela crueldade com o Fantomas”, frases assim era o que mais se ouvia entre os homens. Apenas uma referência à Barraca do Gabriel, quem sabe alguém possa se lembrar da filha dele. A musiquinha que fizemos eu esqueci. (parágrafo direcionado a quem viveu aquele momento lá) Acompanhando o patrão conheci as principais fábricas de camisas, meias, calças, etc., que existiam no Bairro do Brás em São Paulo. Muitas coisas alegres ou chatas eu ainda poderia dizer daqueles dias, mas acho mais interessante lembrar que vi muitos homens e mulheres trabalharem muito, buscando a sobrevivência. O meu patrão era um sujeito muito otimista, parece que para ele o dia seguinte seria sempre muito lucrativo, mas fui testemunha de que na maiorias das vezes era só frustração.
JV do Lago
Enviado por JV do Lago em 07/09/2020
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