Estava eu lá tocando a minha vida, mais preocupado em dar conta de atender da melhor maneira possível a clientela e ao mesmo tempo conseguir um faturamento suficiente para manter tudo funcionado;  quando meu sócio, que era do serviço público, me falou de um concurso e se eu não gostaria de me inscrever.  Fiz a tal inscrição e ali mesmo naquele local comprei as apostilas.
Fazendo uma adaptação no dito popular, digo que como teimosia pouca é bobagem, mergulhei de cabeça para entender aquilo tudo que era exigido.
Entre tantos itens para estudar, os únicos que me eram familiares era o português e a matemática.
Familiares até a próxima esquina, que estava distante somente uns dez passos de mim.
Eu não sabia ou não me lembrava de nada, tanto de português  quanto de matemática.
Passei no tal concurso, que era considerado bem difícil.
Depois de muito tempo, quando já não esperava mais, saiu a minha nomeação.
Tomei posse e fui para o meu local assumir o cargo.
Levava comigo a minha natural timidez, juntada com aquela gerada pelo fato de ser um estranho no ninho.
Eu nunca tinha pisado em um escritório para trabalhar; meus ofícios sempre foram relacionados com a mão na graxa, nas tintas; de administrativo somente os meus humildes negócios.
Iria agora me relacionar com autoridades respeitadas , com engravatados, gente formada em universidades famosas ou não.
Eu era um do povão. Daqueles que carregam as culpas pelas misérias do país. Que entulham os rios com lixo. Que geram a violência tão temida por todos.
Fui surpreendido, decepcionado, fiquei aliviado.
Aliviado por perceber que não era verdade que a classe mais humilde é a culpada pelas mazelas em todas as suas formas. São isso sim, vítimas.
Essa é uma conclusão já de um bom tempo de trabalho, que teve início em uma péssima atitude de um engravatado, com formação superior e até profissionalmente respeitado no seu meio de atuação.
Naquele tempo não havia muita restrição para fumantes.
Aquele sujeito acabou de tragar o seu cigarro e para a minha surpresa, jogou a bituca naquele granito impecável, que a faxineira tinha acabado de limpar.  


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