MALDIÇÕES DO CASARÃO
Pouca gente toca no assunto ou aceita conversar sobre ele.
Dali de perto, acostumados com o dia a dia, os moradores não dão importância para o que veem ao longe, no entanto, ninguém se aproxima, pois ouvir o que vem de lá de dentro do casarão os amedronta. Não é só pelo o que se ouve, mas pelo o que se pode sofrer devido às maldições que com o passar do tempo as pessoas foram incorporando como verdades. Não, ninguém vai lá há anos. A estrada que passa pela propriedade, com acesso ao curral e posteriormente a casa, também fora abandonada por todos os que conheciam ou conhecem o que se passou e o que ainda acontece naquele lugar. Ninguém vai até lá, ninguém trabalha lá. O casarão sempre bem iluminado, de longe se vê as lamparinas se movimentarem, como que carregadas por alguém. Nas pastagens o gado é viçoso. Plantações misteriosamente bem zeladas. A estrada que ninguém transita também impecavelmente conservada. Transita sim, na época da colheita do café, se vê, sempre com o escurecer da noite, carros de bois, carregados, com as suas tristes cantigas, rumarem para o terreirão que margea o casarão. Grandes carroções, puxados por seis burros, conduzidos por pessoas irreconhecíveis, são vistos à noite, levando embora a produção de café da propriedade. Naquele belo vale, passa um rio não muito caudaloso, mas impõe bastante respeito. Uma grande queda vertical de mais de cem metros de altura, faz daquele lugar um espetáculo natural. Na parte alta da cachoeira, havia uma trilha de acesso, que permitia a chegada até a beira daquele abismo recoberto pelo paredão branco formado pela água que cai. Lá embaixo, ladeado por barrancos muito altos, uma revolução formada pela água no final de sua queda batendo violentamente contra o leito natural do rio, que continua dali em uma suave cachoeira. Local inacessível, apelidado de inferno. Inferno pelo temor que causava ao se observar como era e pelo som característico gerado e reverberado nos paredões laterais. Soava como urros ferozes. Crenças sobre esse lugar não faltavam e não faltam e também não faltavam e nem faltam motivos para elas existirem. Muitas vidas humanas se encerraram ali naquele precipício. O Coronel Dilermano, que herdara aquela magnífica propriedade, incorporou a ela as partes pertencentes a seus irmãos e também herdeiros Albertino e Laurentina, ambos jovens e solteiros. Os porões do casarão foram, a mando do Coronel, transformados em masmorras para castigar os escravos rebeldes e ainda úteis. Os escravos velhos e doentes, o Coronel mandava que fossem jogados no abismo, que fossem jogados no inferno. Debaixo dos chicotes dos jagunços, os próprios escravos é que empurravam os inválidos para a morte. Essa prática foi mudada, depois que alguns escravos úteis, ao empurrarem os seus para o abismo, também se atiraram no precipício. Então os próprios jagunços passaram a fazer a escolta e a execução dos condenados. O coronel colocou impiedosamente nas masmorras os seus irmãos Albertino e Laurentina. Os escravos os mantinha precariamente vivos, conforme a vontade do Coronel Dilermano. O Coronel não formou família, os anos foram passando e inexplicavelmente o corpo do Coronel foi secando. Seus irmãos morreram à míngua nas masmorras, seus corpos não foram retirados de lá. O Coronel não morreu, transformou-se em um ser esquelético, e nessa forma, administra a fazenda e a mantém funcionando, ajudado por figuras irreconhecíveis iguais a ele. Os gritos de maldição que se ouve vindo do casarão, são gritos dos irmãos do Coronel, são destinados a todos aqueles que se omitiram em ajudar a libertá-los das masmorras e àqueles que negociaram com o Coronel e de lá obtiveram seus lucros. As lamparinas que vagam e iluminam as noites no casarão, são os inocentes assassinados clareando as injustiças que foram cometidas nos imundos negócios do Coronel Dilermano. Pouca gente toca ou aceitar tocar no assunto sobre as injustiças cometidas nos negócios espúrios dos Coronéis. Instagram @jvdolago
JV do Lago
Enviado por JV do Lago em 28/09/2020
Alterado em 28/09/2020 Copyright © 2020. Todos os direitos reservados. Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor. |